terça-feira, 2 de novembro de 2010

Equipe 3 – poemas de Vinicius de Moraes

 ANÁLISE DE TEXTO

Poética


De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.

A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.

Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã

Na primeira estrofe, o poeta estabeleceu uma relação lógica entre os espaços de tempo que instituem o dia (manhã, tarde, dia e noite), para de caracterizar a passagem do tempo. Trabalhou com a antítese, demonstrando que a seqüência temporal que forma a vida é cheia de contrastes, de negação: - manhã x escureço, talvez por interpretar manhã como o início, a inexperiência;
- tarde x anoiteço, talvez por interpretar anoiteço, como cobrir de trevas (um dos significados, figurado, de trevas é estupidez, ignorância;
- noite x ardo (perceba que arder, além de significar consumir-se em chamas, também significa estar aceso). É a ambiguidade da vida: no início, a inexperiência marca nosso viver; na adolescência, a ignorância, ou seja, o início do aprendizado; na fase adulta, a sabedoria, a habilidade, a prática da vida.
Já na segunda estrofe, ao dizer O este é meu norte, empregou o verbo nortear, que significa  dirigir, orientar, guiar, então ele diz que se guiava pelo este (leste), local em que o Sol nasce, A oeste a morte contra quem vivo: O oeste, onde o sol se põe, representa o fim, a morte, contra a qual ele vivia, ou seja, não desejava a morte, diferentemente dos poetas românticos.
Outros que contem passo a passo, ou seja, os outros é que possuem a responsabilidade de se preocupar com a sucessão de dias; a ele cabia o ato de renovar-se constantemente (Eu morro ontem / Nasço amanhã), sem se inquietar com os acontecimentos cotidianos.
Meu tempo é quando pode representar o eterno, ou seja, também não importa a época em que se vive. O que importa é viver, enfrentando  as contradições, as negações que se nos apresentam durante a vida.
Como se trata de análise de texto, evidentemente há várias maneiras de se interpretar o que o autor escreveu. Cada um tem sua própria maneira de enxergar as mensagens pretendidas pelo autor.
Ausência
Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei… tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada
Análise
Este poema, escrito em 1935, quando o poeta tinha apenas 22 anos, revela uma forte marca romântica.Trata-se de um lindo poema de versos livres, em que se desenham imagens de amor e desprendimento, que expressam a paixão e a angústia de um amor que não poderá se consumar.
O ideal do amor  inatingível está presente em toda a extenção de seus versos. Porém, quando reclama a“terra amaldiçoada”, percebe-se que o poeta usa de um vocabulário muito forte para o delicado e sutil romantismo, o que aponta para uma idéia  ainda mais pessimista .Também se pode entender pelo verso: “Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto”, que esse cansaço é o tédio ou a melancolia que acompanham toda alma sensível e que nem o amor escapa de suas forças.Sendo assim, Ausência é um lindo poema de amor, em que sentimentos como a sinceridade, a paixão e o desprendimento acabam por enriquecer de nobreza os sentimentos do enamorado, que pouco acredita no amor convencional. E para manter a chama sempre acesa da paixão, prefere o idealizante amor platônico, em que a distância, de alguma forma, colabora para a eternização da mulher amada:
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite